Nos últimos anos a questão da qualificação profissional para se construir um Carnaval de qualidade sem ter de recorrer a profissionais de fora de Bragança Paulista tomou conta das quadras e mesas de bar na cidade.
O ex-secretário de Cultura e Turismo, Alessandro Sabella era favorável a concessão de verba pública para as Escolas de Samba mediante a utilização da mesma no comercio interno, fazendo assim o capital girar na própria cidade. A idéia era excelente, porém, diante da facilidade de se obter uma Escola totalmente pronta em São Paulo ou em outros grandes centros acabou por gerar inúmeras discussões acerca do tema.
Uma das alegações mais comuns ouvidas por aqui era de que em Bragança Paulista não havia mão de obra qualificada para realizar tal trabalho.
Pois bem...
Vamos fazer um breve porém exclarecedor retrospecto na história do Carnaval bragantino e refletir sobre essa máxima, vendo se ela é verdadeira ou totalmente equivocada.
Quando o Carnaval de rua de Bragança Paulista foi oficializado e o desfile das Escolas de Samba passou a acontecer, 100% dos trabalhos eram realizados na cidade e ao entorno das comunidades. Agremiações como Unidos do Lavapés e Nove de Julho (ambas cinquentenárias) se espelhavam e executavam seus trabalhos aos moldes do Carnaval carioca, obtendo resultados semelhantes aos vistos pelos lados da Guanabara.
Ainda na década de 70, tinhamos ao nosso dispor material humano de qualidade, pois neste periodo, Bragança assistiu a desfiles memoráveis, como "O Mundo Encantado de Monteiro Lobato" e "Francisco Alves, a Vóz de Ouro do Brasil" (Unidos do Lavapés 1977 e 1978) e "Chica da Silva" (Nove de Julho 1978). Nos desfiles citados, podemos perceber o deslumbre de fantasias, adereços e principalmente do trabalho extremamente detalhado em alegorias e esculturas, com destaque total para as peças produzidas por Roberto Cestari, marceneiro e carnavalesco de primeiríssima linha, que durante anos emprestou seu talento a Verde e Rosa bragantina.
Figurinistas e costureiras então tinhamos (e ainda temos!) aos montes. Na Unidos do Lavapés o trabalho era praticamente realizado em família em uma grande oficina de costura, onde as irmãs Ana (mamãe!), Nair e Clarisse, eram responsáveis por grande parte das fantasias da Escola. Na Acadêmicos da Vila, a queridíssima dona Anazir resiste até hoje à frente do ateliê da Azul e Branco, uma tradição que perdura desde a década de 70. No início da Nove de Julho, Benedita da Silva e Eunice da Luz eram as responsáveis pelo luxo e pelo requinte, marcas da Vermelho e Branco.
Escultores então... tinhamos aos montes. Em uma rápida lembrança posso citar o Gil, José Bueno (artista plástico responsável por inúmeras esculturas espalhadas pela cidade), João Fackir e talvés o de maior destaque, Delmer Thiago de Lima. Alguns desses ainda se encontram em atividade, porém, vêm perdendo espaço para os desfiles prontos trazidos de fora.
Deu para perceber que material humano existe, o que falta é vergonha na cara para superar a comodidade e o gritante desvio de verbas que acaba ocorrendo em algumas agremiações com compras e vendas inexplicáveis.
Onde quero chegar com essa postagem é na idéia de um Carnaval realmente feito a mão em plena segunda década do ano 2000. O que até a bem pouco tempo era praticamente impensável passa a se tornar uma ainda tímida, porém, esperançosa visão em meio a nuvem de irracionalidade que insiste em pairar sobre o nosso Carnaval.
Em 2010 a Acadedêmicos da Vila foi campeã do Grupo Especial com um desfile totalmente produzido aqui, com as pessoas da comunidade da Vila Aparecida e Morro do Sabão trabalhando ativamente em pró dessa conquista. A emergente e promissora Império Jovem vem desde 2008 apostando nos talentos bragantinos para desenvolver o seu Carnaval. Desde então, a Alvi-Negra esteve fora do Grupo Especial apenas uma vez, em 2009.
Para 2012, além das duas agremiações já citadas, a Mocidade Júlio Mesquita também está apostando no que temos de bom aqui. Grande parte do nosso Carnaval está sendo realmente feito em nossa cidade. Fantasias construídas passo-a-passo, alegorias trabalhadas com peças confeccionadas por artesões locais e o mais importante: com a cominidade voltando a trabalhar pela Escola.
Um dos talentos descobertos recentementes e integrados a rotina de um barracão é o escultor Paulo Roberto (foto). Conhecia o Paulo já a uns 4 anos e desconhecia este talento para a escultura. Após saber que ele tinha algumas noções do assunto, resolvi convida-lo para fazer um teste no nosso barracão e hoje o Paulo é uma peça fundamental dentro da minha equipe.
Esta é a prova de que o talento "Made in Bragança" ainda existe, basta apenas ser lapidado e ganhar oportunidades.
A LIESB (Liga Independente das Escolas de Samba de Bragança Paulista) até tem um projeto voltado para a formação de futuros profissionais do Carnaval por meio do Ponto de Cultura, porém, está se equivocando grosseiramente em confiar as funções de professor a pessoas que não vão acrescentar nada a formação desses alunos. Por exemplo, no curso de escultura e artesanato (um erro juntarem as duas coisas), ministra as aulas minha prima Nathalia de Oliveira, uma artesã e artista plástica de mão cheia, porém, os trabalhos realizados por ela consistem basicamente em reaproveitamento de materiais. Ou seja, reciclagem. Querem formar escultores??? Trabalhem com escultores. É simples. No curso de figurino e fantasia temos o aderecista (não é carnavalesco, ok) Cristinano Lima, um excelente decorador, porém, não desenha e não trabalha com armações de metal, a menos que o entreguem estas prontas. E aí pergunto eu, dá pra formar alguem com excelencia no assunto??? É claro que não!!!
É por essas e outras que um Carnaval tão qualificado e promissor como o de Bragança Paulista deu essa estagnada nos últimos anos. E sinceramente, não vejo possibilidades de crescimento consideráveis a curto prazo.
Vamos repensar o nosso Carnaval, afinal, é uma festa do talento e que envolve as habilidades de muita gente. Gera emprego e faz o capital girar em nossa cidade.
Com o meu tão sonhado Carnaval feito a mão, todo mundo sai ganhando, principalmente Bragança Paulista e o seu povo.
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